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domingo, 24 de outubro de 2021

Infâncias Sequestradas



Ele caminhava silencioso pelo corredor da padaria, menino de uns dez anos, cabisbaixo, roupa puída, mas limpa. 

Senhora, pode ajudar a alimentar minha irmã? 

Quase não entendi a pergunta.

Preciso de leite. ̶ era pedido-sussurro. Meneei a cabeça em um quase “sim”. Continuei as compras, depois  conversei com meu marido sobre o pedido. Ele foi pegar uma caixa de leite. Estávamos no caixa, apontei para o leite e olhei para o menino, angustiado pegou um saco de leite em pó e mostrou para mim.

Pode ser esse?  ̶  perguntou. Meu marido acenou que sim. A caixa reclamou sobre ele ainda receber e ficar escolhendo o que ganhar.

  Tem muita gente com fome hoje em dia   Se a irmã for pequena, melhor um leite que dilua.  

Arde meu estomago num sentimento deslocado. Despedi-me do menino na porta, uma outra senhora o ajudou com pão e ovos. Quase feliz desce a rua.

Vivemos  força de guerra, criança!  Segue invisível, escolha sombras e descansa, o sol arderá até tarde.  Versos compõe nossos dias, A cruzada das crianças de Brechet diz presente.  Meninos brincam de bola as margens de rios-esgotos, empinam pipas nos aterros e viajam no faz de contas nos caminhos das feiras, enquanto empurram os carros-de-mão.

Vivemos força de guerra, criança! 


Ana Paula Mira, escritora.

#anapaulamiraautora @ana.paula.mira