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quinta-feira, 10 de fevereiro de 2022

De volta pra escola, mamãe!

 







Tive os primeiros anos de alfabetização numa casa que funcionava como escola pública no centro de minha cidade natal. Uma casa de paredes altas, piso de madeira, um porão que alimentava nossas fantasias e um quintal imenso, com tamarineiro e mangueiras. Tínhamos acesso ao quintal por uma escada, quase um corredor para um mundo mágico de brincadeiras.  Os encontros nesse local foram as melhores memórias de minha vida escolar. Eu tinha uma bolsinha recheada de bolas de gude, preparada para qualquer oportunidade de brincar. Só trocava as bolinhas pela bola de futebol. Na minha infância não houve limites em relação a como uma menina podia se divertir. Todo começo de ano letivo lembro-me disso. Agora, neste mês de fevereiro, mês de retorno às aulas em Salvador, esse encontro tão esperado para as crianças contemporâneas foi substituído por uma realidade distópica, cheia de protocolos, orientações e medidas. Além disso,  enfrentaram a retirada de especialistas para as séries iniciais, como de Artes e Educação Física. Acredito que isso se deve aos  cortes financeiros que a educação vem sofrendo há alguns anos. Quase dois anos de pandemia e nos preparamos pouco, a sociedade não repensou a alfabetização dessas crianças, o financiamento diminuiu.

 Em países como Noruega e Dinamarca, a Educação Infantil tem um projeto especial, pois é uma série crucial para o desenvolvimento adequado das crianças. O Brasil tem excelentes pensadores na área da educação, poderíamos ter um grande projeto, mas não temos. E isso não  é algo restrito à nossa cidade. O especialista em literatura infantil e Presidente do Instituto de Leitura Quindim escreveu artigo recente sobre como a retirada de recursos afetou as crianças na cidade de Caxias do Sul no Rio Grande do Sul. 

Há mais de dois mil anos o filósofo Platão estabelecia os princípios para o bom desenvolvimento do aluno na educação elementar, entre eles estava a importância da Arte e da Educação para promover o equilíbrio na vida do cidadão romano, para conter a barbárie. Vivemos em um país onde a violência está na sua formação estrutural. Basta estudar a nossa história para verificar isso. Quando vejo ondas de violência extremas, como linchamentos, penso que o trabalho de Artes e principalmente de Educação Física pode favorecer  e impactar de maneira significativa a formação dos jovens, e que Platão tinha razão. Uma base forte será a diferença desse jovem, são memórias corporais e mentais que o acompanharão por toda a vida. Alguém pode perguntar: “Mas você teve essas aulas com especialistas?”. Não, mas tive um tempo de recreio impensável nos dias atuais, espaço para jogar na escola e fora dela, já que meu pai era jogador profissional e incentivava muito o esporte, e nasci com vocação para arte e apoio familiar, o que muitos desses jovens não têm e não terão. O ambiente escolar pode oferecer isso. Arte e atividade física significam saúde mental, equilíbrio.

Ana Paula Mira, escritora.

#anapaulamiraautora @ana.paula.mira

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