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sábado, 13 de fevereiro de 2021

A Persistência da Memória








Chega até meus ouvidos notícia triste, enquanto separo para minha sogra livros que emprestarei mais tarde. As vacinas não chegaram na mesma velocidade que os números de contaminados por covid aumentaram. Suspiro, segurando um livro de Jorge Luís Borges em minha mão, o livro com o título História Universal da Infância e outras Histórias. Penso no realismo mágico e na distopia em que vivemos. Sinto um sufoco no peito, àquele que senti quando minha avó mudou-se para Ilhéus. A realidade ganha tons de ficção. A epidemia vista em filmes, lida em livros, assombra fora dos sonhos. Surrealismo dos quadros de Salvador Dalí, a falta de oxigênio, ameaça a humanidade. As crianças seguem assistindo aulas por telas, como nos filmes de ficção científica, a era da informática foi acelerada pela pandemia. Mas a interpretação dos textos, não. Não pela maioria. As notícias chegam por redes sociais, e as falsas verdades se instalam, sem a menor pesquisa. Os especialistas e a ciência é negada. 
Separo outro livro, A metamorfose de Kafka. Estaríamos virando insetos? Incomodamos tanto a natureza, que estamos sendo expurgados? Essa, e tantas teorias rondam-nos, nada comprovado. Buscamos uma resposta, e nos contentamos muitas vezes com teorias de conspirações. 
Passo a mão pelo livro e penso que somos feitos afinal de histórias e cada um escolhe sua narrativa. Então, qual será a história que contaremos no futuro? Qual será a história universal da infância na pandemia neste século? Algum autor conseguirá expressar? 
Será que minha sogra  já leu Retrato de um Artista quando Jovem de James Joyce? Acho por bem levar esse romance. Lembro que preciso  pedir que deixe os livros em quarentena. A avó de minha filha ainda não foi vacinada.

Ana Paula Mira, escritora.

#anapaulamiraautora @ana.paula.mira

Foto: Obra Salvador Dalí, "A Persistência da Memória" (1934)

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